Crónica de Alexandre Honrado | Quantos dias tem uma semana

Quantos dias tem uma semana
 (quantas semanas tem um dia?)

Leio informação dispersa mas muito sólida, livro após livro, e faço uma pausa olhando uma parede aparentemente branca onde alguém tatuou um desabafo.  Tenho quase inveja; sobra-me pouco tempo para as paredes que por vezes acolhem festas, celebrações difusas do que vai na cabeça de cada qual.
Na última semana acabei um (excelente) livro francês sobre as revoluções russas (sim, há que registá-las no plural) e a guerra civil que se lhe seguiu; depois, li um outro título sobre os cem anos da Declaração Balfour (pela Grã-Bretanha, em 1917) e sobre a figura de Haim (Chaim) Weizmann, o obreiro da  mesma Declaração e futuro primeiro presidente do Estado de Israel (ou do segundo Estado, se tiver em conta que o primeiro é bíblico: Israel é o nome dado a Jacob, depois de uma luta com um anjo , vencendo-o, ao que se seguiu depois uma longa história).
Nos intervalos, espreitei as evoluções na Catalunha e sobreveio na minha memória uma outra história antiga, com centenas de anos que, mais dia menos dia, contarei à minha maneira.
De seguida repesquei um velho livro (digo velho, pois foi editado no ano em que eu nasci), sobre a cultura portuguesa.
Como a semana tem sete dias, preparei o projeto anual do Núcleo de Investigação que está a meu cargo; e escrevi paralelamente um punhado de textos pouco profundos, por exemplo uma pequena biografia minha, para um projeto de teatro, para o qual fui convidado. Sempre que escrevo uma pequena biografia minha, ou a oiço pela boca de alguém, imagino a alegria que podia ter sido aproveitar aquilo tudo sem preocupações pelo meio…
Em meu redor, alguns reclamam: é isso que fazes do tempo, meu desgraçado? Não quis dizer-lhes que dei ainda umas aulas pelo meio e que preparei a intervenção no Congresso que assinala os 500 anos do levantamento de Lutero contra a Igreja romana. E do mais que fiz, nem falo, não vá receber alguma reguada.
Não estou exausto, mas muito parecido comigo.
Vou à janela e digo para relaxar, em voz alta, aquela passagem do Hamlet que (todos?) sabem de cor: Ser ou não ser, é isso a questão (como Sophia de Mello Breyner Anderson traduziu). Qual será o partido mais nobre? Suportar as pedradas e as frechadas da fortuna cruel ou pegar em armas contra um mundo de dores e acabar com elas, resistindo?
Provavelmente, apesar de toda a atividade, ficarei pela cena I do ato III, de Hamlet, mas sempre em busca de respostas.

 

Alexandre Honrado

Escritor

 

 

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